Jukebox
Era um pub meia boca… desses que tem espalhado por toda a Europa. Não me leve à mal, não odeio pubs, eles só nunca vão chegar aos pés de um bom botequim.
Eu andava meio frustrado com a vida, com o trabalho, com o fato de que estou ficando calvo, velho e sem nenhuma perspectiva de um futuro emocionalmente instável. Então entrei nesse pub quando começou a chover. A câmera tava encharcada e eu estava realmente preocupado em perder todo o filme. Eu já nem me lembrava nas primeiras fotos, mas eu não podia me dar ao luxo de perdê-las. Eu já havia perdido muita coisa naquele ano.
O lugar parecia uma cidade fantasma. Tinha um velho dormindo na mesa dos fundos, e só uma garçonete no balcão. Estava realmente morto pra uma sexta-feira, eram seis da tarde e aquele lugar deveria estar lotado.
– Uma Weissbier, por favor – fiz meu pedido olhando pra garçonete ao me sentar no bar.
Ela se dirigiu à torneira e tirou o chopp mais bonito que eu já tinha visto na vida.
– Aqui.
– Escuta, você pode me explicar como um lugar desses tá vazio numa sexta feira à noite?
Ela ficou surpresa.
– Você não é daqui, né?
– Não nasci aqui. Mas sou daqui faz dois anos… Acontece que eu não saio muito de casa.
Ela riu.
– Depois que abriu esse restaurante de happy hour americano, ninguém mais vem aqui, a não ser quando a fila está dobrando a esquina e olhe lá.
Chacoalhei minha cabeça de forma negativa.
– O que foi? – perguntou sem entender.
– As pessoas. Elas vão pra qualquer lugar, ou fazem qualquer coisa só pra imitar outras pessoas. E por causa disso, coisas e lugares com alma morrem.–
Eu olhei pros fundos do pub e vi uma maquina de vinil, daquelas com centenas de discos dentro e apontei pra máquina.
– Quando foi a última vez que alguém usou aquela máquina?–
Ela exibiu uma expressão pensativa.
–Olha… Eu não consigo me lembrar de ninguém. Talvez ninguém desde que eu fui contratada. Isso tem uns três anos.– Ela falou como quem parecia que tinha notado algo muito interessante.
–Pois bem, posso pedir uma ficha?–
–Claro.–
Ela pegou uma escadinha e subiu até a ultima prateleira da estante do bar, colocou o braço no fundo e pegou uma caixinha. Estava bastante empoeirada, mas deu um soprão e deu pra ver o quão bonita era a embalagem. A caixa era azul marinho e escrito em prateado dizia “Die Ganze Musik” – Todas as músicas.
Peguei uma ficha e me dirigi a máquina, pluguei na tomada e um milhão de luzes iluminaram o pub. Aquele lugar em mogno monocromático virou um arco-iris. E algo interessante aconteceu. Depois de alguns minutos, algo interessante aconteceu. Outras pessoas entraram no bar.
Umas reclamavam da fila enorme do outro lado da rua, outras diziam que gostavam do som que vinha daquele pub. A garçonete teve que ligar pro chefe pra servir tantas pessoas.
Quem diria, bastava uma jukebox e uns discos de vinil, pra trazer as pessoas de volta.
Ecleticamente boêmio e desesperadamente romântico. Cada pé na bunda rende mil cervejas e alguns poemas.